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Neivodependência

No mercado de trabalho atual, aqueles que se tornam imprescindíveis num determinado cargo são vistos como um risco para a organização

Há alguns anos atuei como consultor de uma indústria plástica e lá tive a oportunidade de interagir inúmeras vezes com Neivo, o respeitado gerente de produção que possuía 45 anos na época.

Tratava-se de uma pessoa que detinha um grande conhecimento técnico e inúmeras habilidades para resolver os mais diferentes problemas operacionais. Contudo, algo chamava a minha atenção: ele sempre aparentava cansaço e tinha uma fisionomia sofrida por causa do número considerável de horas que dedicava ao seu trabalho. Aliás, geralmente era o primeiro a chegar e o último a sair.

E por que isto acontecia? Porque sua compreensão a respeito de comprometimento no trabalho era um pouco distorcida. Por exemplo, quando alguém errava, ele mesmo assumia o maquinário e resolvia o problema sozinho sem que o funcionário em questão participasse do processo. Esta é apenas uma das situações que explica a postura dependente apresentada pela equipe que liderava e que pode ser resumida no seguinte mantra: “Como nós viveríamos se o Neivo não estivesse à frente do nosso time?”

O interessante é que as pessoas também percebiam este quadro, mas só interpretavam o lado positivo de sua disposição em colaborar com o time, sem alertá-lo a respeito das falhas que cometia e poderiam ser corrigidas.

Tudo começou a mudar quando, algumas semanas mais tarde, ele acabou sofrendo um grave problema de saúde que limitou suas horas de trabalho na organização. Um duro golpe para quem havia tido um comportamento centralizador até então e via a fábrica que tanto estimava praticamente parar nos dias em que não estava por perto.

Enquanto conversávamos com ele sobre a necessidade de descentralizar as tarefas a fim de que a empresa não ficasse à mercê de sua presença física, o que era muito arriscado e custoso, percebíamos o olhar de quem compreendia tudo e aparentava a intenção de mudar. Ainda mais porque seu pessoal já havia criado um termo que resumia o problemão: a neivodependência.

Contudo, alguns meses depois, os avanços foram mínimos, a dependência da equipe persistia e os prejuízos na produção se mostravam cada vez mais vultosos. A diretoria da empresa tomou a decisão de demiti-lo, isto é, já que o Neivo não mudava, eles o mudaram.

É claro que no início houve uma certa confusão e alguns alardeavam que a empresa estava “com os dias contados” sem a presença de alguém tão importante. O lado cômico desta história toda é que três meses depois a companhia estava muito bem graças ao desempenho do novo gerente de produção e ninguém mais lamentava a ausência do Neivo.

No mercado de trabalho atual, aqueles que se tornam imprescindíveis num determinado cargo são vistos como um risco para a organização, afinal de contas nenhuma empresa quer permanecer refém de quem quer que seja.

Quando alguém transmite seu conhecimento, descentraliza as decisões e forma sucessores torna-se substituível no cargo presente, mas também abre as portas para que a organização possa olhá-lo como indispensável, independentemente da ocupação que o aguarda no futuro.

E qual a responsabilidade das organizações diante de circunstâncias semelhantes? Basicamente precisam fazer duas coisas: alertar seus profissionais o quanto antes a respeito das mudanças que se fazem necessárias e dar apoio concreto às pessoas para que possam vencer a resistência inicial que certamente sobrevirá. É possível criar um final feliz para todos.

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