Na minha adolescência, uma série muito famosa passava na televisão brasileira: “A família dinossauro”. E se você também a assistia, deve se lembrar de que os episódios traziam críticas bem-humoradas sobre o estilo de vida da sociedade daquela época, apesar de ser classificado como um programa infantil.
Um dos personagens do seriado era o Sr. Richfield, um chefe carrasco que, além de grosseiro, mal-humorado e exigente, também gostava de culpar Dino (o patriarca da Família Silva Sauro) por tudo o que lhe acontecia. E por essas e outras, Dino vivia insatisfeito com o seu trabalho e pensava todos os dias em abandonar o emprego, mas diante das responsabilidades como pai, aceitava aquela situação.
Ao longo de muitas décadas, pessoas com a personalidade do Sr. Richfield estiveram à frente das empresas e quase todo mundo acreditava que esse era “o jeito certo de fazer as coisas”, apesar da crescente improdutividade e do baixo engajamento das pessoas que trabalham em qualquer tipo de ambiente tóxico.
Quando as companhias começaram a se dar conta de que precisavam buscar modelos de liderança mais eficazes, seus gestores foram convidados a frequentar as salas de aula para aprenderem a liderar pessoas de verdade e não apenas a obter resultados custe o que custar. Foi a partir daí que temas soft relacionados à gestão de pessoas, como feedback, assertividade, comunicação não-violenta, liderança situacional e administração de conflitos, por exemplo, conquistaram a relevância atual.
Liderando o negócio
O problema é que muitas empresas se empolgaram tanto em desenvolver o lado soft da liderança que ele virou o único mantra corporativo, relegando o tratamento das questões hard – que potencializam os resultados de negócios – para o segundo, terceiro ou quarto plano. A consequência é que seus principais líderes não sabem responder três questões cruciais: “Como se ganha dinheiro nesse negócio hoje em dia?”, “Para onde o nosso mercado está caminhando?” e “O que precisamos fazer de agora em diante para termos um futuro promissor?”
O que estou tentando comunicar a você é que inúmeras companhias capacitaram seus gestores para serem ótimas pessoas, mas quando eles são exigidos a tomar decisões e executá-las, mostram-se inábeis. Você deve continuar a tratar as questões soft na sua empresa, mas seus líderes também precisam aprender a gerir as mudanças que sustentarão o negócio daqui em diante.
Estratégias e metas
Pensar a estratégia é cansativo e trabalhoso porque exige que você enxergue os próximos passos que a sua companhia deve dar no mercado. Quais prioridades estabelecer, como lidar com os movimentos dos concorrentes, que tipo de pessoas “trazer para o barco” e quem já passou a hora de sair dele, quais valores incorporar no dia a dia da organização…
Quando você pede aos seus líderes que leiam livros soft vai ter como resposta ensinamentos preciosos sobre relações humanas, mas – infelizmente, tenho de concordar – a empresa só consegue se tornar competitiva quando você também os ajuda a alargarem a visão sobre o mercado no qual atuam e promove encontros para discussão da estratégia corporativa nas quais todos, quase sempre, saem exaustos.
Tornar-se alguém que inspira as pessoas é o objetivo de vida número um de muitos líderes e, se esse é o seu caso, tenha ciência de que não nos tornamos um bom modelo de gestor apenas ao tratarmos as pessoas com a forma respeitosa que elas merecem ou escutando aquilo que dizem. Líderes geralmente são tidos como inspiradores quando batem metas desafiadoras consistentemente, com o time e fazendo certo, como lembra Vicente Falconi. Ou seja, quando implementam ações que poucos executivos têm coragem de tirar do papel e, além do mais, não fazem isso sozinhos.
Se a sua empresa está dando um enfoque exagerado nas questões soft, ajude a alta direção a enxergar o problema. Essa talvez seja uma das principais contribuições que você pode dar à companhia.